fonte viva
As palavras que de mim jorram e que atabalhoadamente aterram neste meu papel já muito riscado não são mais que uma vã tentativa de me prolongar para além da própria vida, de espalhar o calor que me aviva mesmo quando este já não o puder fazer, de escolher para mim um destino diferente do que aquele que me reserva um lugar debaixo da terra para já daqui a bocado.
Já fui mais forte. Já pensei que os meus símbolos numa folha, como aqueles que hoje escrevinho, eram capazes de derrotar a própria morte. Já fui mais frágil. Já tentei acorrentar a minha mão a histórias perdidas, inseguranças ou desmesuradas expetativas, essa mão que com a caneta é tão mais ágil.
Sou uma fonte de pedra partida, perdida nas profundezas de uma rua deserta, esquecida, mesmo sendo o refresco tão desejado numa tarde de verão em que o calor aperta. Não tenho melodia, o meu gorgolejar é canto bastante, não tenho luz, mas a minha água brilha que nem diamante.
Não sou vistosa nem fácil de encontrar, mas é extremosa a minha vontade de saciar a sede de vida que nas almas mais aventureiras ousa pulsar. Não sou única e muito menos a primeira, mas sou pura e não menos verdadeira, e posso ser a frescura que te vem recordar que há mais a fazer nesta vida do que vê-la passar.
Não sou poeta nem autora de qualquer volume de prateleira, mas tenho a meta de fazer gente correr o mundo sem sair da cadeira. Claro que nem por mero segundo penso tal poder conseguir conquistar, mas hei de ir, hei de vencer, ou hei de morrer a tentar.